*Por Ricardo Taveira

Não dá mais para negar os benefícios da mais nova tendência no setor financeiro, o open banking, modelo que devolve ao cliente final a portabilidade de seus dados bancários e permite que ele acesse e movimente suas contas por meio de diferentes plataformas, sem depender do internet banking e do aplicativo de seu banco. Com o anúncio oficial por parte do Banco Central da regulamentação, ainda em 2018, do open banking, aquilo que era tendência vira uma realidade concreta e imediata.

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Um tema relevante que o avanço do open banking coloca no centro do debate e que vale analisar é o da desconcentração bancária. O problema da concentração é uma pedra no sapato da economia brasileira. Em junho, o Banco Central (BC) admitiu que o Brasil está entre os países com maior concentração bancária do mundo. De acordo com o seu Relatório de Economia Bancária (REB), que reuniu dados do Banco de Compensações Internacionais (BIS), em 2016 os cinco maiores bancos do país — Caixa, Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander — controlavam, juntos, 82% dos ativos.

Com uma política regulatória que até agora prezava pela estabilidade acima da competitividade e inovação — algo parcialmente compreensível, dado o nosso histórico macroeconômico —, o resultado prático para o consumidor não poderia ser diferente: pouca oferta, pouca inovação e preços maiores.

O processo de “reação” por parte do próprio BC não se iniciou agora com a objeção da compra feita pelo Itaú da XP ou até mesmo com o anúncio da regulamentação do open banking, mas muito antes, em 2013, com a regulamentação das “Instituições de Pagamento” (IP). Naquela época, o BC inovou ao criar um “banco light”, que poderia prover serviços básicos bancários como conta, com serviços de recebimento e pagamento, desde que respeitada a condição de que o dinheiro do cliente não poderia ser colocado em risco ao ser emprestado para terceiros. As instituições de pagamento, com a obrigação do que seria na prática um “compulsório” de 100%, nem teriam a necessidade de se filiar ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC), uma vez que todos seus recursos seriam depositados no Banco Central ao fim de cada dia.

Desde então, vimos uma explosão das “IPs” no mundo de cartão pré-pago, cartão de crédito, entre outros. Até mesmo uma fintech que poderia se tornar banco comercial sem muito esforço, como o Nubank, optou por permanecer como “IP” quando lançou, em 2017, a sua “Nuconta”. Se em 2013, a lei da Instuição de Pagamento ajudou a trazer inovação e concorrência pelos novos “bancos”, a regulamentação do open banking trará a concorrência para dentro dos bancos existentes.

A regulamentação, que de acordo com o BC deve sair até dezembro, permite expandir a oferta de produtos e serviços financeiros a um menor custo e com melhor experiência para o consumidor, o que deve pressionar os bancos a reverem suas estratégias e reajustarem seus preços de acordo com a concorrência. É a velha lei da oferta e da procura em favor do consumidor e sem alterar a estabilidade do mercado.

Além disso, a melhora na análise de crédito dos clientes, possibilitada pelo acesso aos dados bancários via APIs (Interfaces de Programação de Aplicativos, em inglês), pode contribuir para reduzir os juros e derrubar o elevado índice de inadimplência — segundo o Serviço de Proteção de Crédito (SPC), até julho deste ano, o país somava 63,4 milhões de inadimplentes, quase o equivalente à população da Itália.

Como se vê, a tecnologia aponta para um novo ciclo de estabilidade no mercado financeiro. Dito isso, é bom fazer uma ressalva: os bancos consolidados não devem temer o futuro que se desfralda diante de seus olhos. Isso porque, se por um lado o open banking acirra a concorrência, por outro ele estimula a cooperação.

Afinal, esta será a chance de um setor tradicional se renovar dentro de um ambiente de disputa saudável, redefinindo seu portfólio de produtos que pode, inclusive, ser complementado com a oferta de outras fintechs. Na França, por exemplo, o BPCE, o segundo maior grupo bancário daquele país, oferece dentro de sua plataforma de varejo o serviço de remessa de câmbio da fintech TransferWise, a despeito de naturalmente já possuir uma área de câmbio tradicional. O raciocínio — já consagrado por atores como Amazon, que abraçaram o marketplace em seus mercados — é simples: a única coisa pior que a redução de margem que vem com a distribuição de produtos de terceiros, é a chance de perder o cliente por completo quando se oferece um mix de produtos sem competitividade de preço e péssima experiência de usuário.

Apesar da excelência de fintechs como o Nubank causarem consternação na medida que lançam novos produtos, basta lembrar a evolução do iPhone para concluir que, mesmo com produtos excelentes, um ecossistema fechado não consegue concorrer com a inovação descentralizada das plataformas — algo evidente quando se confronta o marketshare de 85% do Android contra os 14% do iOS, sem desmerecer a excelência reconhecida do iPhone.

Se a inovação e excelência de algumas empresas já trazem pressão competitiva para os atores tradicionais, a regulamentação do open banking tem o duplo papel de catalisar inovações ainda maiores e fornecer a ferramenta para a reação por meio de novas parcerias.


open banking no Brasil*Ricardo Taveira é CEO da Quanto, plataforma ponta-a-ponta de open banking no Brasil.

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